quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Cara e Cultura Negra movimenta o Teatro Nacional

Sérgio Maggio Do Correio Braziliense
Na mostra Corações da África, oito fotógrafos exibem trabalhos inéditos

Eita negro! Quem foi que disse que a gente não é gente? Quem foi esse demente, se tem olhos não vê... Menino negro, nascido no bairro de São José, no Recife, filho do sapateiro Manuel Abílio e da quituteira Merença, Solano Trindade, usou a poética como trincheira contra o preconceito do Brasil que conheceu no século 20, de forte ranço escravocrata e com um fio de oportunidade para os herdeiros da senzala. Celebrado como o Poeta da Resistência, completaria 100 anos de vida em 2008. A partir de hoje, o elitista Teatro Nacional Cláudio Santoro é dele, ou melhor, do povo afro-descendente. O projeto Cara e Cultura Negra espalha-se pela casa de espetáculos mais importante da capital federal. — Vamos ocupar o foyer com 200 painéis para contar a história da África e dos africanos que foram trazidos ao país. Vamos saudar não só a África Negra, mas a Setentrional (Egito, Marrocos), falar das atuais políticas públicas e afirmativas (as cotas, a Lei Maria da Penha), enumerar as influências da comida, na língua, na cultura, na arquitetura e homenagear alguns negros de expressão (Machado de Assis, Tia Ciata), conta Flávia Portela, coordenadora da mostra e prefeita do Conic, orgulhosamente, o pedaço mais negro do Plano Piloto. Até o Dia da Consciência Negra, 20 de novembro, Brasília, como legítima capital do país de população majoritariamente de afro-descendentes, assume-se como uma cidade de "cor" matriz do povo brasileiro. Mostras de fotografias, shows, desfiles de moda, gastronomia, espetáculos de dança, teatro e palestras querem chamar a atenção da população para a importância da cultura afro-brasileira no cotidiano. — Esse projeto nasceu no processo de requalificação do Conic. A idéia é questionar a falta de conhecimento do brasileiro sobre a cultura negra, já que o ensino é falho e a abordagem, completamente equivocada. Queremos falar da nossa origem e discutir essa abolição inconclusa, que completa 120 anos em 2008, analisa Flávia Portela. O público, por exemplo, pode voltar os olhos ao continente africano, esquecido e apagado do mapa global pela vigente ordem econômica mundial. Na mostra Corações da África (foyer da Sala Villa-Lobos), oito fotógrafos, a maioria estrangeiros, exibem trabalhos inéditos, alguns sobre etnias da Etiópia e Mali. Uma das séries mais poéticas é a do pesquisador norte-americano Steven Evans, associado ao Centro Internacional de Estudos Etnográficos, localizado em Atlanta (EUA). Ele chega à cidade para participar do projeto Outro Olhares, a ser lançado na comemoração dos 50 anos de fundação de Brasília, em 2010. — Esses fotógrafos vêm mapear o DF. Vão fotografar das entrequadras às cidades-satélites. São especialistas no registro antropológico da cultura negra, destaca Flávia Portela, que confirma a presença do suíço Marco Paoluzzo, dos holandeses Vincent De Groot, Dos e Bertiel Winkel, do português Rui Palha, dos norte-americanos Boaz Rottem e Steven Evans, da belga Martin Heigan e da catarinense Silvana Leal. Com todas as atividades gratuitas, Cara e Cultura Negra começa oficialmente nesta quarta, às 18h, com a ocupação do foyer e da Sala Villa-Lobos e o mezanino do Teatro Nacional (a mostra fotográfica Travessias femininas: passado e presente). Às 21h, o Balé Folclórico da Bahia sobe ao palco, com ingressos que estão sendo distribuídos há uma semana. — Vamos incensar o foyer com ervas aromáticas e colocar uma trilha de black music, enquanto o espectador segue apreciando o módulo educativo e as mostras fotográficas. Haverá ainda desfile de moda, estandes de produtos de beleza para o negro e um tabuleiro de acarajé da baiana Akini, acrescenta Flávia. Até o dia 20, três grandes shows movimentam o Cara e Cultura Negra. Sexta-feira, talentos da música negra no DF, como Ellen Oléria e Sérgio Magalhães (o sofisticado sambista e pedreiro), encontram-se com grupos como Caiana de Crioulos (PB) e Marabaixo (AP). No sábado, os africanos da Guiné Bissau Petit Mamadi e Fanta Kanatê, que fizeram uma elogiada apresentação, no mês passado, na Caixa Cultural, puxam noite de ritmos com Peu Meurray (BA), Mamour Ba (Senegal) e Babilak Bah (MG). Essas apresentações começam às 19h na área externa do Teatro Nacional Cláudio Santoro, em espaço batizado como Clementina de Jesus. No Dia da Consciência Negra, o Conic será devidamente ocupado por discotecagem, batalha de rimas, peleja de rap e repente e show de Negra Li.

Fonte: http://divirta-se.correioweb.com.br/materias.htm?materia=5112&secao=Programe-se&data=20081105

Nenhum comentário:

Postar um comentário