domingo, 2 de novembro de 2008

Festival homenageia Cora Coralina com peças, recitais, degustações e outros eventos

Letícia de Souza Do Correio Braziliense.com.br
Poeta goiana Cora Coralina publicou nove livros. O primeiro, aos 76 anos.

Ainda hoje, o biólogo Paulo Bretas Salles se lembra daquele ano de 1974. Aluno da Universidade de Brasília, ele resolveu dar um tempo nos estudos e se mudar para a casa da avó, a poeta goiana Cora Coralina, na Cidade de Goiás. Lá, tinha longas conversas com ela sobre literatura e sentia o perfume dos doces, preparados diariamente em tachos de cobre no fogão a lenha. "Sou mais doceira e cozinheira do que escritora, sendo a culinária a mais nobre de todas as artes: objetiva, concreta, jamais abstrata...", dizia a autora, no poema Cora Coralina, quem é você?, publicado em 1976. "Foi um período de muito aprendizado. Além de vê-la fazendo doces de mamão, figo, laranja, ouvia histórias e conversava com pessoas que a visitavam. A casa tinha portas abertas para todos", recorda-se o neto. Paulo faz parte da Associação Casa de Cora Coralina, criada em 1985 com o objetivo de manter um museu vivo em Goiás e zelar pela preservação da memória e obra da poeta. Uma das ações do grupo é o Festival de Doces e Poesias de Cora Coralina, que movimenta Brasília de hoje a sábado, em diferentes locais. Com entrada franca, o evento reúne filmes, espetáculos teatrais, recitais de poesias, apresentações musicais, feira de livros, artesanato e, claro, degustação de doces. Também busca a inclusão social, por meio de atividades gratuitas para idosos, estudantes de escolas públicas do DF e doação de títulos em comemoração ao Dia Nacional do Livro (hoje). "Queremos homenageá-la da forma como ela gostava: louvando os doces, a poesia, e exaltando o otimismo, a crença na vida", ele explica. Na abertura do festival, hoje, às 19h, no Espaço Cultural Renato Russo, o público poderá assistir ao documentário Cora, doce Coralina, de Armando Lacerda e Vicente Fonseca. Premiado no 19º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, em 1986, o curta foi filmado na casa em Goiás e mostra a autora declamando seus poemas. Após a exibição do filme, haverá um recital de poesias com Lilia Diniz e degustação de doces prediletos de Cora. Em seguida, o cantor e compositor Marcelo Barra fará homenagem à escritora. "Ela representa o começo da minha carreira e se tornou parceira", conta o goiano, referindo-se a um clipe de 1981, que contou com a participação da poeta. Marcelo vai cantar Cora Coralina, música de sua autoria; Todas as vidas e Serenata – poemas dela musicados por ele –, além de composições regionais sobre o pequi, o Rio Vermelho e o famoso empadão goiano. Amanhã, o destaque é a peça Flor de beco, do grupo brasiliense Teatro do Inconsciente, apresentada no Sesc de Taguatinga, às 15h. Inspirada na obra de Cora e Monteiro Lobato, a montagem foi construída após três anos de pesquisa sobre a cultura popular do interior do Brasil, especialmente de Goiás e São Paulo. Na sexta, às 20h, será a vez do espetáculo Cora Coralina, coração encarnado, dirigido por Orã Figueiredo. No elenco, Renata Roriz, Rita Elmor e Teresa Seiblitz. Indicada ao prêmio Shell em categoria especial pelo roteiro e pela iniciativa da produção, a peça estreou no Rio de Janeiro em 2006 e passou por São Paulo. No palco do Espaço Cultural Renato Russo, as três atrizes darão voz às personagens de Cora Coralina e entrevistas da poeta, dos 90 aos 95 anos, serão projetadas em um telão. "O roteiro (de Renata Roriz) apresenta três fases. Na primeira, há passagens pela infância de Cora. Depois, as relações com o marido e os filhos e o trabalho. A última é ela pensando na morte, na velhice, relembrando a infância", conta o diretor. Segundo ele, as atrizes não declamam poemas, mas vivem crianças, mulheres operárias, entre outras figuras, e acabam fisgando o espectador. "Isso é mérito de Cora. Ela atinge o coração." Quem foi Cora Nascida em Goiás, em 1889, Ana Lins dos Guimarães Peixoto Bretas, a Cora Coralina, teve uma trajetória literária peculiar. Apesar de escrever desde menina, seu primeiro livro, Poemas dos becos de Goiás e estórias mais, só foi publicado quando ela tinha 76 anos. Com quase 90, um dos exemplares chegou às mãos do poeta Carlos Drummond de Andrade, que, em crônica do Jornal do Brasil, em dezembro de 1980, disse: "Admiro e amo você como a alguém que vive em estado de graça com a poesia. Seu livro é um encanto, seu verso é água corrente, seu lirismo tem a força e a delicadeza de coisas naturais". A partir daí, Cora recebeu homenagens, como o título de doutora honoris causa pela Universidade Federal de Goiás e o Troféu Juca Pato da União Brasileira de Escritores. Reconhecida como contadora de histórias e coisas de sua terra, ela teve nove livros publicados, entre poemas e contos para adultos e crianças. Morreu em Goiânia, em 10 de abril de 1985. Leia, na íntegra, o poema Cora Coralina, quem é você?

Fonte: http://divirta-se.correioweb.com.br/materias.htm?materia=5035&secao=Programe-se&data=20081029

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